domingo, 31 de outubro de 2010

Uma notícia indesejada: Faleceu hoje, 31 de outubro, o poeta Ildásio Tavares

Acabo de receber a notícia por intermédio de Maria da Conceição Paranhos. Acompanhei o drama de Ildásio desde o lançamento de Silêncios, em Salvador, quando estive com Gil Vicente, seu filho, que me falou da sensível situação em que o poeta se encontrava.
Para mim é difícil imaginar a situação, pois em menos de um ano estive com Ildásio em três oportunidades, duas delas falando sobre sua poesia: uma na Academia de Letras da Bahia, a outra no evento em homenagem aos seus 70 anos, ambos em Salvador. Ainda em outra oportunidade, durante o colóquio Bahia de Todas as Letras, para o qual consegui trazê-lo a Ilhéus, onde fez uma conferência sobre literatura baiana. Em todas as oportunidades ele se mostrava bem e disposto, lúcido e falante como sempre.
Muito se falará no meio literário Brasileiro sobre sua importância e contribuições, sobretudo como poeta, ensaísta e tradutor. Para mim ficará, acima de tudo isso, a importância do homem, do mestre e do amigo, me auxiliando sempre nos estudos, pelo menos durante os últimos três anos.
Deixo para o leitor o artigo que escrevi para o Encontro Literário da Academia de Letras da Bahia sobre a poesia de Ildásio, provavelmente a figura mais importante da poesia baiana do século que passou.

Ildásio Tavares: existência consagrada à poesia

É impossível ater-se à história da literatura baiana no Século XX sem se dedicar demoradamente a Ildásio Tavares. É tão vasta a sua obra, sua formação e suas incursões literárias que seria inviável e extravagante, no curto espaço que temos, discorrer sobre essa questão.
Mas vale lembrar que aos nove anos de idade Ildásio já tinha lido toda a obra infantil de Monteiro Lobato, que antes do ginásio era fluente em latim, francês e inglês. Formado em Direito e Letras pela UFBA, tem Mestrado cursado na Southern Illinois University, USA, em 1971; Doutorado em Língua Portuguesa na UFRJ, em 1984; e Pós-Doutorado na Universidade de Lisboa, com bolsa do Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, 1990.
Como literatura não se faz com nomes nem com títulos, ao seu agente sempre é exigido produção, renovação ou silêncio, como é o caso de muitos escritores que não passaram de um par de livros, ou até mesmo de um único, o que não o impede de ter a obra reconhecida e valorizada, como é o caso de Sosígenes Costa, grapiúna como Ildásio, falecido em 1968 com apenas um livro publicado.
Esse, certamente, não foi o caso de Ildásio Tavares que estreia na poesia no ano de 1967, com poemas inseridos na antologia “Moderna Poesia Bahiana”. Seu primeiro livro veio ao público em 1968, com “Somente Canto”, a esse seguem-se outros, entre os quais se destacam: “Tapete do Tempo”, 1980; “IX Sonetos da Inconfidência”, 1997; e o moderno “Odes Brasileiras”, de 1999.
Talvez o próprio vate não se dê conta, mas também podemos acrescentar à sua biografia a importante e valorosa contribuição que dá ao futuro da poesia brasileira ao abrir, generosamente, as portas da sua casa aos jovens escritores baianos que para lá marcham semanalmente em busca de um papo agradável e, principalmente, conselhos sobre seus escritos.
 Ali, na varanda da casa, na espaçosa sala de visitas ou no escritório repleto de livros e correspondências, tendo ao fundo o mar de Itapuã, muita gente ouviu Ildásio falar sobre a arte de escrever. Ali, sob sua pena severa, porque severa é a poesia, muita gente aprendeu a escandir um verso, muita gente ouviu falar pela primeira vez em soneto, redondilha, ode ou terça rima. Ali, muitos livros, poemas, poetas e críticos foram estudados à exaustão.

No dizer de Jorge Luis Borges um livro somente merece ser lido se for capaz de entreter. Foi dessa forma, me entretendo, dando inúmeras gargalhadas, literalmente, que li ainda no original o livro mais recente de Ildásio Tavares, “As Flores do Caos”, 2009, vencedor do prêmio literário do Pen Clube de Portugal em 2010, uma obra que reúne sonetos selecionados pelo autor, frutos de uma vida inteira dedica à arte, especialmente à poesia. Entre eles estão os IX Sonetos da Inconfidência, escolhidos para esse encontro.
Em meio a tão bons poemas, cada leitor acaba tendo o seu preferido. Certo mesmo é que tudo gira em torno de personagens importantes da Inconfidência Mineira. Esses personagens se transformam em símbolos, e as composições em versos decassílabos, com grande versatilidade e muita inventividade.
Sentia-me feliz ao descobrir em cada poema uma variação métrica própria, a forma como o poeta desloca a cesura dos versos sem perder a musicalidade. Aqui o de Arte Maior, ali o Sáfico, o Heróico. Vemos a estrutura do poema cedendo ao impulso da emoção.
O destaque maior fica por conta do poema III, O Alferes. Trata-se de um grito zombeteiro, apesar de angustiado, de Joaquim José da Silva Xavier, dentista e militar de baixa patente que ficou sendo o símbolo maior do movimento. Enforcado, teve seu corpo esquartejado e seus pedaços exibidos em lugares onde pregou ideais de liberdade. O alferes no primeiro quarteto: Meu coração é um arsenal de horrores/ e dores que atropelam meu país./ Gargalha, puta! Zomba, meretriz!/ O dia há de chegar dos teus senhores.
Fábio Lucas, um dos mais importantes críticos e conferencistas internacionais de literatura brasileira, unanimemente apontado como um dos críticos literários mais importantes do Brasil, reportou-se sobre estes poemas dizendo que O trabalho de Ildásio Tavares vai além do divertimento semântico. Sob pretexto de celebrar personagens de nossa história, constrói sonetos carregados de sentido, mensagens plurivocais, pejadas de palavras explosivas, pois, no curso da sonora abundância, se atiram além das idéias, como uma carruagem iluminada na escuridão da noite.

Em “O canto do homem cotidiano”, 1977, a poesia de Ildásio Tavares estabelece uma lírica que quer se esquivar da realidade opressora do nosso tempo, sem, contudo, deixar de reconhecê-la, como faz no poema que dá título ao livro: Eu canto o homem vulgar, desconhecido/ Da imprensa, do sucesso, da evidência/ O herói da rotina,/ O rei do pijama,/ O magnata/ Do décimo terceiro mês,/ O play-boy das mariposas/ O imperador da contabilidade.” (...) “Mas que, na frustração cotidiana,/ Vai encontrando aos poucos sua glória/ Por isso eu canto a luta sem memória/ Desse homem que perde, e não se ufana/ De no rosário de derrotas várias/ E de omissões, e condições precárias/ Poder contar com uma só vitória/ Que não se exprime nas mentiras tantas/ Espirradas sem medo das gargantas/ Mas sim no que ele vence sem saber/ E não se orgulha, campeão na história/ Da eterna luta de sobreviver.

Este é o homem que encontramos nas ruas, nos bares, nas praças, nos bancos. Homens que jogam bola, capoeira, dama, dominó. São profissionais autônomos, empregados no comércio, na indústria e funcionários públicos. Todos estes, matéria prima para a lírica moderna, onde o poeta canta a própria existência em confronto à realidade opressora do nosso tempo. Perguntado sobre essa questão em uma entrevista que nos concedeu o poeta responde que sempre foi assim. Contudo, em nossa época, o poeta sofre uma crise tão forte de identidade ante um sistema esmagador que, às vezes, cantar sabe a um grito no escuro.
Ciente que o tempo do artista difere do tempo do homem comum, o poeta abre mão das cronologias para privilegiar o seu tempo interior e mostra-nos uma alma que difere do mundo circunstante. Alheia às necessidades humanas, a poesia insiste em colocar o inexistente acima do existente. No poema O meu tempo (infelizmente fora do rol que nos foi passado), do qual trazemos aqui apenas um fragmento, ele nos mostra tal implicação com clareza:

Não existe hora certa, existe o meu relógio,
Lembrando sempre com seu tic-tac
Que há vida
Para ser vivida,
Que houve a vida
Que não se viveu.
Não importa que o rádio renitente ruja
São tal hora e tal minuto,
Hora oficial,
Afinal,
Que há de oficial em minha vida?

Se O que vale na vida não é o ponto de partida e sim a caminhada, como afiança Cora Coralina, então, povoada de momentos de uma história construída pelos trajetos que vem percorrendo, de análises teóricas dos autores, de poetas, de músicos, enfim, o cotidiano presente, da religiosidade, ilustrando o acadêmico, o conhecimento e as ideias, o cognitivo e o afetivo, o singular no plural, o universal no particular, com inventividade e ironia, a obra de Ildásio Tavares, pode-se dizer, tem as qualidades necessárias para, por certo, ser considerada uma obra importante.
Podemos afirmar que o substrato da sua poesia está em uma determinada concepção onde o criador se constrói ao se relacionar com o mundo concreto, como observamos também no poema Restos, onde ao estabelecer relações e interações com outros homens, se apropria dos dados da cultura através das mediações simbólicas que estabelece e que se configura por sua totalidade, causando a estranheza necessária para tirar o leitor da sua inércia e levá-lo à reflexão.

Para concluir, compartilhamos as palavras do crítico literário e historiador Nelson Werneck Sodré sobre o poder de criação de Ildásio Tavares, considerações com as quais nos alinhamos totalmente. Diz ele: É fácil compreender a alta qualidade do poeta. Em primeiro lugar pelo domínio da arte poética na linguagem de síntese que é sua essência. E ainda pela capacidade, nessa linguagem, praticar aquilo que Brecht ensinou, as diferentes maneiras de dizer a verdade.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Quase toda cultura - Grave denúncia feita pelo poeta e profº Jotacê Freitas

Tive acesso ao CATÁLOGO – CULTURAS POPULARES & IDENTITÁRIAS DA BAHIA e fiquei estarrecido e estupefato com informações incompletas para um livro que se propõe a mostrar TODA CULTURA, como o apresenta o Secretário de Cultura.

A edição é primorosa e de qualidade técnica exuberante, fotos de qualidade e breves textos de apresentação das manifestações culturais populares da Bahia. O referido catálogo foi produzido pela gráfica do Liceu de Recife, o que mostra que nem pro próprio Governo a EGBA faz um trabalho com preço baixo.

Meu primeiro susto foi ir ao capítulo 13.CORDEL & POESIA POPULAR, ilustrado com a capa de um dos meus folhetos, PANVERMINA E ZABELÊ NAS QUEBRADAS DO SERTÃO, premiado no Concurso Nacional de Literatura de Cordel, promovido pela Fundação Cultural em 2005 e não encontrar o nome do autor exposto, muito menos relacionado na lista de cordelistas da Bahia, que aliás contém apenas os dados de 20 poetas, sendo 3 de Salvador, o que não corresponde à realidade da nossa Literatura de Cordel.

Parece que os funcionários da Secult não quiseram visitar o próprio acervo e pesquisar na Antologia Baiana de Literatura de Cordel, editado em 1997, no Censo da Cultura Popular publicado em 2000 com 10 volumes, ou ainda, no Catálogo do Acervo Bibliográfico da Fundação Cultural do estado da Bahia – Coleção Folhetos de Cordel, publicado em 2006.

Os editores nos informam na apresentação que “mestres e agentes de cultura, representantes de manifestações, associações culturais, brincantes, folcloristas, líderes comunitários, trabalhadores comuns, artistas e pesquisadores da área, preencheram, manual ou eletronicamente, o formulário, respondendo à chamada pública da Secretaria.” Mesmo não tendo recebido esse chamado e o formulário eletrônico, tive meu nome e de outros poetas encaminhados à Secult para esse fim. Alguns que receberam e preencheram o formulário não foram contemplados da mesma forma. Ficamos sem saber quais os critérios adotados para a inclusão no catálogo.

Talvez digam que estou ressentido e magoado pela exclusão, mas de certa maneira estou contente por estar junto de grandes mestres que também não constam nesta relação, alguns internacionalmente conhecidos: Franklin Maxado, Bule-Bule, Antonio Queiroz, Caboquinho, João Ramos, Jurivaldo Silva, Antonio Alves, Ismoca, Mariano Imperador, Zévalter Pires, Creusa Meira, Pardal de Jaguaribe, João Augusto, Sérgio Baialista, Carlos Alberto, Davi Nunes, Gutemberg Cruz, Zumar Sérgio, Gilmara Cláudia, Maysa Miranda, Litinho, Otacílio Teixeira, Nestor de Piatã, Alvinho do Riacho, Zaia e muitos outros que não lembro no momento, mas que numa sentada no arquivo de folhetos poderia citar uns cem, imagina trabalhando confortavelmente numa cadeira giroflex numa sala acarpetada com ar-condicionado, água gelada e cafezinho quente à disposição?

No evento que ocorreu durante a semana no Pelourinho, a Feira de Cordel possuía apenas 15% de folhetos produzidos por poetas baianos, os 85% restantes eram de pernambucanos, paraibanos, cearenses e potiguares, nada contra os colegas nordestinos, mas se o evento era de Cultura e Identidade Baiana, nada mais coerente que ter autores baianos participando.

Em relação à minha cidade, Senhor do Bonfim, e às outras manifestações, fiquei mais frustrado ainda, pois temos servidores representantes de cultura e apenas Tijuaçu teve o nome incluso em duas categorias: Capítulo 11-Comunidades Quilombolas e Capítulo 33- Samba.

Será que não temos manifestações ativas nas categorias: Banda de Pífanos, Culinária, Danças de Roda, Literatura de Cordel, Expressões culturais religiosas, Forró&sanfoneiros, Quadrilha, Teatro de Rua & Teatro Popular?

Talvez a metodologia do Governo seja a de que ‘democraticamente divulgamos na internet e nossos servidores reencaminham aos interessados’ esquecendo-se de que os artistas populares têm dificuldade de comunicação, locomoção e informação.

Pra chatear mais ainda, no texto de apresentação, os editores afirmam que “só é possível(...) implementar políticas públicas que possam promover o segmento com a participação efetiva da população.” Aonde???

O pior de tudo é saber que nosso dinheiro, arrancado de nossos bolsos através de impostos direto na fonte salarial ou nas compras de bens básicos para a sobrevivência e bem estar, está sendo mal usado e esse catálogo, com certeza, em breve estará servindo de escora para algum móvel numa repartição pública qualquer ou mofando num dos depósitos da Secult.

Uma forcinha pro Rafael Noris

Pessoal, o ótimo blog Hai-Kais (ver link ao lado), do Rafael Noris, está no 2º turno do Prêmio Top Blog 2010. Ou seja, está entre os 100 melhores blogs do Brasil na categoria cultura. Ele agora precisa de uma forcinha nossa para que consiga ir ainda mais longe.

Vamos nessa! É só cadastrar nome e e-mail, depois eles enviam uma mensagem para que se confirme o voto.

Eis o link:

Vem aí o 21º Encontro Brasileiro de Haikai

O evento acontecerá em São Paulo, no dia 6 de novembro, sábado, das 14 às 17 horas, na Associação Miyagui Kenjinkai do Brasil. Eu deveria estar presente fazendo o lançamento de Silêncios para o público paulista, mas um compromisso assumido anteriormente impossibilita a minha participação. No mesmo dia farei uma apresentação com a banda Mendigos Blues na segunda edição do Rock & Poesia, em Ilhéus.

Associação Miyagui Kenjinkai do Brasil
Rua Fagundes, 152, Liberdade, São Paulo, SP
(Entre as estações de metrô Liberdade e São Joaquim)

Anúncio de voto de Ferreira Gullar é falso

Circula na internet um falso anúncio em que o poeta Ferreira Gullar, “pela grandeza do nosso país”, pede votos para Dilma, informa Ancelmo Gois. Gullar, eleitor de Serra, acaba de dar entrevista ao “Público”, de Portugal, dizendo que “Lula comprou os pobres do Brasil”. O jornalista Eric Nepomuceno, um dos organizadores do ato dos intelectuais pró-Dilma, também recebeu o falso anúncio e condena quem fez isto com Gullar “Têm circulado listas de adesão à candidata do PT completamente falsas. Tentam desmoralizar um trabalho sério”.

Fonte:
O Globo - 27/10/2010 - Por Ancelmo Gois

Confira a citada entrevista do Gullar:
http://antenacrista.blogspot.com/2010/10/lula-comprou-os-pobres-do-brasil.html

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

As leituras de Fernando Pessoa chegam à web

Conhecer o que lia Fernando Pessoa, as anotações que fazia nos seus livros, como ideias para poemas surgiam durante suas leituras. Agora, isso vai ser possível a qualquer pessoa: já está disponível na internet a biblioteca digital do poeta português, no site da casa-museu dedicada a ele. Os livros são os que acompanharam o poeta desde a adolescência - na época em que ele ainda morava na África do Sul. "O livro mais antigo é do século 19, quando Pessoa tinha 12 a 14 anos. São livros que vão desde essa época até sua morte, com 47 anos", conta o professor Jerônimo Pizarro, responsável pelo trabalho. O último livro foi parar na biblioteca do escritor em outubro de 1935, um mês antes de sua morte. No total, o espólio de Fernando Pessoa que está na casa-museu reúne 1.312 títulos. No entanto, apenas pouco mais de 1.100 estarão disponíveis para consulta.



terça-feira, 26 de outubro de 2010

Novo blog discute o futuro digital do livro

Muito se fala informalmente sobre o livro digital, entretanto há pouca fonte de informação sobre o assunto em português, mas com a chegada do blog Tipos Digitais, a informação virá mais completa. Nele, Carlo Carrenho, diretor do PublishNews, pretende analisar o mercado do livro digital, sempre do ponto de vista que interesse ao mercado brasileiro, mas sem perder o foco nas experiências internacionais. “A revolução digital já começou e está acontecendo com uma rapidez assustadora. Criei esse blog para apresentar as tendências internacionais e analisar o que ocorre no Brasil”.

Acesse o blog: www.tiposdigitais.com

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

O lançamento de Silêncios, em Ilhéus

O lançamento de “Silêncios” em Ilhéus, mesmo tendo acontecido em um dia com muitas atividades culturais na cidade, foi muito bem sucedido. Os principais sites e blogs da região repercutiram a notícia, bem como TV’s e jornais, fato que colaborou decisivamente para o bom comparecimento do público em geral e escritores à Casa de Arte Baiana.

À Dida Moreno e demais amigos deixo aqui os meus agradecimentos. Novembro será a vez de levarmos Silêncios para São Paulo, dentro do 21º Encontro Brasileiro de Haikaístas.

 
Com Dia Moreno, nossa anfitriã

Autografando o exemplar de Maurício Corso,
presidente da Fundação Cultural de Ilhéus.
À frente os filósofos e escritores Dorival de Freitas e Piligra

Com o casal Cris Passos e Marcelinho, músicos


O amigo Pawlo Cidade e a molecada, uma festa só!

sábado, 23 de outubro de 2010

O CREDO DE DON JUAN

Baseado no Don Juan Tenório, de Tirso de Molina
The Dwarf Don Juan Calabazas,
de Diego Rodriguez de Silva y Velazquez
Creio num Deus vil e atormentado,
arrogante em meio às visões de bem e mal,
cego ante a face exaurida do amor.
Creio nesse Deus, cujo reino não tem fim,
e ao mundo lanço o meu laço sabendo que após o gozo
              viverei contraditória agonia.
Como um ciclo que nunca se cumpre
volto aos braços da sedução,
náufrago e só, tecendo a minha teia.
O fogo aquece meu corpo e não arrefece,
e a alma, dos seus tormentos não se esquece,
escarnece o céu não por prazer, mas por convicção.
Ah, ter escrúpulos é não ter mesmo nada!

(Gustavo Felicíssimo)
Esse poema faz parte do conjunto vencedor do
Prêmio Bahia de Todas as Letras, edição 2009

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Hoje, Lançamento de "Silêncios" em Ilhéus

Hoje, dia 21, às 19 horas, a Casa de Arte Baiana abre oficialmente suas portas em Ilhéus, na Rua Antônio Lavigne de Lemos, 76, próximo à Academia de Letras, com o lançamento do livro “Silêncios”. O espaço possui um acervo raro de artes plásticas, com obras de mestres como Kennedy Bahia, Sante Scaldaferri, Saulo Portela e Washington Sales. São 94 obras de arte do acervo particular de Michael Eckes, colecionador e promotor do intercâmbio cultural que, com recursos próprios, tornou realidade o empreendimento.

A Casa de Arte Baiana pretende estabelecer interações com outras formas de arte, incluindo a literatura, por isso a abertura do espaço com o lançamento de "Silêncios, o que me deixa muito feliz, pois de algum modo é o reconhecimento do nosso trabalho que após longo percurso, quando me aproximo dos 40 anos,  posso ver meu primeiro trabalho totalmente autoral sendo lançado aqui na Terra dos Ilhéus.

todos são bem-vindos, sobretudo os de boa fé





quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Só com os poetas se pode aprender algo novo

Tudo já está nas enciclopédias e todas dizem as mesmas coisas. Nenhuma nos pode dar uma visão inédita do mundo. Por isso é que leio os poetas. Só com os poetas se pode aprender algo novo.

                                        Mário Quintana

terça-feira, 19 de outubro de 2010

97 anos de Vinícius de Moraes

Hoje o poetinha faria 97 anos. Nada melhor que lembrá-lo lendo alguns dos seus mais significativos poemas. Creio que esses três são os seus melhores.
SONETO DA SEPARAÇÃO

De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.

De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.

De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.


Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.

Oceano Atlântico, a bordo do Highland Patriot,
a caminho da Inglaterra, 09.1938


SONETO DA FIDELIDADE

De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento


E assim quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama


Eu possa lhe dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.


Estoril - Portugal, 10.1939


SONETO DO AMOR TOTAL

Amo-te tanto, meu amor... não cante
O humano coração com mais verdade...
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade


Amo-te afim, de um calmo amor prestante,
E te amo além, presente na saudade.
Amo-te, enfim, com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.


Amo-te como um bicho, simplesmente,
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.


E de te amar assim muito e amiúde,
É que um dia em teu corpo de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude.


Rio de Janeiro, 1951

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Imperdível: Exposição de Vauluizio Bezerra no MAM - BA

“Eu lido com a arte e sua história. Há um campo gravitacional que me atrai a seus múltiplos significados, procuro usá-los não para dá-los novos sentidos, mas para estender minha compreensão dos novos sentidos que temos no mundo atual. Aqui nos defrontamos com um problema que acomete a arte contemporânea e é possível que esteja aí base de sua crise”.

                                       Vauluizio Bezerra

clique na imagem para vê-la em tamanho maior

Geraldo Holanda Cavalcanti toma posse na ABL

A partir de hoje (18), a Academia Brasileira de Letras tem um novo imortal. O diplomata, poeta e escritor pernambucano Geraldo Holanda Cavancanti toma posse na cadeira nº 29, na sucessão do bibliófilo José Midlin, falecido no dia 28 de fevereiro. O novo acadêmico foi eleito no dia 2 de junho com 20 dos 39 votos possíveis. Geraldo é um critico de mão cheia, poeta e prosador dos mais criativos.

Relação externa:

domingo, 17 de outubro de 2010

Lançamento de Silêncios em Salvador

Sábado passado, dia 09, fizemos o lançamento oficial do meu livro Silêncios e de As Flores do Ocaso, de Bernardo Linhares, em uma festa muito bonita no charmoso Sebo Praia dos Livros, em Salvador. Confesso que o evento superou minhas expectativas, principalmente em relação à presença de público, oportunidade em que pude rever grandes mestres da literatura e das artes na Bahia.

Confesso que me diverti muito. Após teve um sarau lítero-musical de primeiríssima. Tudo sob a organização de Daniela Helfstein, proprietária da Praia dos Livros que nos aguentou lá até as 3:00 horas da manhã.

Quinta-feira (21) será a vez de fazermos a festa em Ilhéus, na Casa de Arte Baiana, sob a organização de Dyda Moreno.

Com a mestra Maria da Conceição Paranhos e o poeta Marcus Vinícius Rodrigues

Raymundo Luiz, Sante Scaldaferri, Silvério Duque e eu

Com Douglas de Almeida e Walkíria Freitas

Lendo alguns poemas ao lado de Bernardo

Com o poeta Henrique Wagner

Ao lado de Carlos Verçosa, Bernardo, Raymundo Luiz, Patrícia (minha irmã) e Silvério Duque

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Glauber na era da inocência

Se não fosse pela sabedoria de Zuenir Ventura e, principalmente, pela sua notória falta de memória, Nelson Motta não estaria agora terminando de escrever um ensaio biográfico sobre Glauber Rocha (1939-1981), A Primavera do dragão, que será lançado em março pela editora Objetiva. O livro, que contará com riqueza de detalhes a infância e juventude do mais influente e polêmico cineasta brasileiro e terminará em 1964, ano em que o diretor baiano lançou sua obra-prima, "Deus e o Diabo na Terra do Sol", começou a ser escrito em 1989, mas não demorou muito para ser engavetado. Motta soubera que Zuenir também estava escrevendo, para a Companhia das Letras, uma biografia sobre Glauber e nem pensou em competir com o seu mestre e ex-professor de comunicação escrita, o homem que o encaminhou para o jornalismo. Só não esperava que Zuenir esquecesse, em um táxi, todo o material de pesquisa coletado. Desanimado, desistiu da missão e a deixou nas mãos de Motta.


Fonte: Valor Econômico - 15/10/2010

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Lugar, de Jiddu Saldanha, é um dos finalistas da Mostra Visões Periféricas

Caríssimos, o filme-poema LUGAR, de Jiddu Saldanha, uma delicada discussão sobre os papéis do feminino e masculino na sociedade atual, é um dos finalistas da Mostra Visões Periféricas e está precisando do nosso apoio para seguir em frente. Ou seja, o filme-poema que é inspirada na obra de Caio Fernando Abreu está precisando de votos que o ajudem no resultado final.

Entrevista com Mario Vargas Llosa

Em conversa com jornalistas da Folha no auditório do jornal, ontem à tarde, o Nobel disse que a literatura é uma negação da realidade "queira ou não o escritor". E mais: para Vargas Llosa, ao menos três brasileiros poderiam ter ganho o prêmio: Guimarães Rosa (1908-1967), Jorge Amado (1912-2001) e Euclydes da Cunha (1866-1909). O primeiro, segundo ele, foi prejudicado pela dificuldade de se traduzir sua obra. O segundo, pela característica de escritor popular. Os sertões, de Euclydes, no qual se baseou para escrever A Guerra do fim do mundo, permite compreender não só o conflito de Canudos, mas a América Latina.

Confira trechos:

Coleção Brasiliana, agora na internet

Professor do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Carlos Vainer recomendou aos seus alunos alguns volumes da Coleção Brasiliana, editada entre 1931 e 1993, a primeira com a proposta de reunir "livros que pensassem o País". Levou um susto quando os estudantes voltaram de mãos vazias - a coleção estava esgotada. Vainer começou então a dar forma a um ambicioso projeto: a Brasiliana Eletrônica, cuja proposta era digitalizar os 415 livros publicados pela Editora Companhia Nacional. Não apenas escaneá-los, mas apresentar um trabalho editorial, com informações sobre os autores e a obra reproduzida; oferecer ao pesquisador o fac-símile do livro e ao, mesmo tempo, levar ao estudante o mesmo texto nos padrões atuais de ortografia. 85 obras já estão disponíveis no site.
 

Fonte: O Estado de S. Paulo - 13/10/2010

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Novo artigo de Henrique Wagner: "Tempos sombrios: as poetas sensíveis demais"

Há mulheres e mulheres, como todos sabem. Assim como há leitores e leitores, poemas e poemas e tudo o mais na vida e no mundo. Há até mesmo orbe e mundo, vida e existência, terra e gleba. Quero, no entanto, me ocupar agora com as mulheres que fazem poemas. Mais: as mulheres que escrevem poemas sensíveis. Desculpem os leitores, mas não é exatamente isso. Minha ocupação é mais específica ainda: mulheres baianas que fazem poemas sensíveis demais nos dias de hoje.

Não deixe de ler o texto completo:
http://www.expoart.com.br/artigos/?idt1=31&idt2=col&idt3=henrique_wagner

sábado, 9 de outubro de 2010

Haibun para Flora

A flor desprendida do galho é uma tentativa de voo, e cada voo é sempre maior que a sua distância. Há no ar, levado pelo vento, um jardim de flores múltiplas aprendendo a voar.


borboletas são flores
que afinal foram voar –
voa, minha flor!

-

uma flor pousou
na minha vida de poeta –
eu sorri pra ela.

Em: Silêncios, livro que lançaremos hoje em Salvador

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Gabo lançará novo livro no fim do mês

O escritor colombiano Gabriel García Márquez, prêmio Nobel de Literatura, publicará em 29 de outubro seu novo livro, “Yo No Vengo a Decir un Discurso”, anunciou no México a editora Mondadori. O livro, primeiro do premiado escritor colombiano desde “Memórias de minhas putas tristes” (2004), inclui 22 discursos que foram escritos para serem lidos por ele mesmo diante de um público e que percorrem praticamente toda a sua vida, explicou a editora, afirmando que, na maioria, estes discursos não foram publicados.

Fonte:
Folha Online - 05/10/2010

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

O Nobel de Literatura, merecidamente, vai para Mario Vargas Llosa

A informação acabou de ser apresentada e faz jus à obra desse peruano combatente, candidato a presidência do seu país, perdendo para o facínora Fujimori por um número mínimo de votos, apesar do apoio político qualificado, ótimo programa de governo e sua infinita superioridade ao opositor.
Llosa é um daqueles escritores que denunciam em sua obra o fato de que a hierarquia de castas sociais e raciais está vigente ainda hoje na América Latina. Observo o fato sobretudo em duas de suas obras mais importantes, as novelas “Los cachorros” e “Los jefes”, caracterizadas pelo existencialismo, obras que dão nome próprio e inconfundível a um continente selado por multitudinárias vozes merecedoras da mesma honraria, como é o caso, por exemplo, de Ferreira Gullar.

Vale lembrar ainda que pela Objetiva, segunda-feira chegará às livrarias uma nova obra de Llosa. Trata-se de “Sabres & Utopias”, que reúne textos que tratam de política, América Latina e, é claro, literatura. É uma boa dica para quem quiser conhecer a fundo o seu pensamento. A obra, segundo a jornalista Laura Greenhalgh, do Estadão, reúne ensaios, artigos e documentos organizados pelo colombiano Carlos Granés, doutor em Antropologia Social e expert na obra de Vargas Llosa. Em cinco grandes capítulos, estão aglutinados textos de modo a percorrer o itinerário intelectual (e político) de Llosa, que anteriormente já havia sido agraciado com outros prêmios literários importantes, entre eles, o Cervantes e o Príncipe de Asturias, além de ser membro da Real Academia de Letras da Espanha.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Lançamento duplo em Salvador neste sábado

Eu e o poeta Bernardo Linhares teremos a honra de receber a todos que nos prestigiarem com sua presença. Após, às 21 horas, haverá um sarau de poesia erótica com diversos músicos e convidados. A noite promete!
clique na imagem para vê-la em tamanho maior

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Dom Quixote no YouTube

A Real Academia Espanhola da Língua, em parceria com o YouTube, está convidando pessoas de todo o mundo a participarem da leitura coletiva do clássico 'Dom Quixote de La Mancha'. O romance foi dividido em mais de 2 mil trechos. Os interessados recebem um desses trechos (em espanhol) para ler, gravar e em seguida fazer upload no site de vídeos. Segundo a Academia, a intenção é divulgar tanto o livro quanto a língua espanhola, argumentando que o idioma não ocupa o espaço que merece na internet.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Obra polêmica na 29ª Bienal de São Paulo

A 29ª Bienal de São Paulo está ancorada na ideia de que é impossível separar a arte da política. Essa impossibilidade se expressa no fato de que a arte, por meios que lhes são próprios, é capaz de interromper as coordenadas sensoriais com que entendemos e habitamos o mundo, inserindo nele temas e atitudes que ali não cabiam, tornando-o, assim, diferente e mais largo.
O trabalho abaixo, Autorretrato matando Ahmadinejad, da série inimigos, é do artista plástico pernambucano Gil Vicente e faz parte da 29ª Bienal de São Paulo, que vai até 12 de dezembro. 
Há outro trabalho igualmente bom e polêmico do autor, intitulado Lula Estrangulado, que se não estou enganado a OAB paulista, por meio da justiça, conseguiu proibir sua exposição. Como não temos nada com isso...
Site do artista: http://www.gilvicente.com.br/
Site da Bienal: http://www.fbsp.org.br/index.html

Fórum das Letras debate a cultura africana

A influência africana na cultura brasileira, sobretudo em Ouro Preto, cidade essencialmente erguida pelas mãos dos escravos, será a marca da sexta edição do Fórum das Letras de Ouro Preto, que acontece entre os dias 10 e 15 de novembro, com participação de escritores de países de língua portuguesa. Entre os principais destaques da programação, estão os moçambicanos Mia Couto e Paulina Chiziane, a primeira mulher moçambicana a publicar um romance; e os angolanos Pepetela, Ondjaki, Carmo Neto, João de Melo, Adriano Botelho e João Maimona, entre outros. De Portugal, estão confirmados Luandino Vieira, Inocência da Mata e Margarida Paredes. Fechando a aliança lusófona, participarão do encontro os brasileiros Ferreira Gullar, Alberto Mussa, Nei Lopes, Flávio Carneiro, Marina Colasanti, Laurentino Gomes, Décio Pignatari e outros.

domingo, 3 de outubro de 2010

Diversos Afins - Sugestão de Leitura

Está no ar a nova edição da Diversos Afins. Nela, uma entrevista onde falo um pouco sobre Silêncios, meu livro de estreia e outros temas.


Ao amigos e leitores de Salvador: Silêncios será lançado em Salvador no próximo sábado (09), às 19 horas, na Praia dos Livros, Porto da Barra, ao lado do Instituto Mauá. Na oportunidade também estará sendo lançado o livro As Flores do Ocaso, de Bernardo Linhares.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Jardim de Haijin - Novo livro de Alice Ruiz

Texto de Luiz Tatit
Os primeiros textos de Alice Ruiz que me chamaram a atenção já eram haikais. Eram traduções do poeta japonês Issa Kobayashi, mas acima de tudo soluções que me pareciam mais sintéticas que as originais. Por exemplo:



vaga aqui
lume ali
o vaga-lume


Isso foi há mais de duas décadas. De lá para cá conheci melhor a pessoa, a letrista e a poeta incansável que extrai poesia até da página em branco:


página
que não dá poema
dá pena


Alice vê o haikai como um exercício fundamental para que o poeta saia de si e se concentre no mundo. Menos reflexão e mais apreensão. Menos sentimento e mais observação. O decurso do tempo cede lugar à percepção instantânea e palpável, como se pode ver aqui mesmo:


paineira na chegada
ainda mais florida
no dia da saída


Neste jardim de Alice as palavras precisam se despojar dos sentidos acumulados ao longo da História para refazer a experiência humana a partir de um olhar inédito. Surge então o diálogo direto com as crianças, seres que não fazem o menor esforço para dispor desse mesmo olhar.
E nasce uma espécie de gramática do jardim. Flores, folhas e árvores são substantivos. Vento é verbo. Chuva também. São eles que mobilizam a cena:

vento forte
sementes caem
folhas voam

Toda criança capta essas funções mesmo que não conheça seus nomes. Algumas vezes Alice expira para depois (se) inspirar. Primeiro, esvazia a imagem, reduz sua extensão:


noite estrelada
atrás do portão
última flor


Em seguida, recupera-as com toda plenitude e abrangência:

manhã de primavera
para todas as flores
dia de estreia


Retira para depois adicionar. Forja a debilidade para mostrar o vigor. É também dessa respiração que vive a poesia.
A matéria-prima deste livro não é a natureza. Tal palavra nem aparece nos poemas aqui transcritos. Sua vastidão impessoal seria abstrata demais para caber no haikai. O ponto de partida é o jardim, uma composição de elementos naturais emoldurada pela escrita da artista em perfeita sintonia com as ilustrações de Fê.

Bem simples assim. Jardim de haikaísta. Jardim de Haijin.