quarta-feira, 31 de março de 2010

Ao Rock’n roll

Para Heitor Brasileiro Filho

Todo dia é dia de Rock,
nele solto o meu baixo grito,
verdade com jeito de bicho grilo
e a cabeça fora do lugar.
Um corpo ao meu se apega
no espaço de alguns passos infindos,
entre acordes lamentosos
e o peso da guitarra que não cessa,
que não cessa...
É pau de dar em doido
e só quem amanhece conhece
os bêbados no passeio público,
o sol que leve vem bailando,
refluxo da vida a desfilar.

Nota:
Esse poema nasceu no fogo do Rock & Poesia, evento que promovi em Ilhéus junto com um amigo, e foi construído aos poucos, entre acordes de guitarras e bebedeiras. Nada mais saudável!

terça-feira, 30 de março de 2010

Apanhador de flor-de-lis

Noutro tempo, quando o passado
era presente e o tal futuro
me chegava descompassado,
talvez apenas como um furo

no fogo, no espaço perdido,
meu coração, em ferro urdido,

ambicionava desbravar
o coração do meu país;
ambicionava desbravar:

foi desse modo que me fiz
apanhador de flor-de-lis.

segunda-feira, 29 de março de 2010

Parabéns Salvador (461 anos)

Por Sílvio Benevides

Neste dia (29.03), Salvador completa 461 anos de história. Fundada em 1549 por Tomé de Sousa, “um fidalgo honrado, ainda que bastardo”, como escreveu Gabriel Soares de Sousa no seu Tratado Descritivo do Brasil de 1587, Salvador é uma cidade repleta de paradoxos: rica, pobre, bela, feia, alegre, triste, cosmopolita, provinciana, mesquinha e generosa. Salvador nos enche de orgulho e vergonha. Orgulho por ela ser o que simplesmente é: linda, luminosa, encantadora, festiva, charmosa, hospitaleira, guerreira. Vergonha por insistir em conservar no seu dia-a-dia o desrespeito oriundo de todas as camadas sociais, a falta de educação de quem nela habita, a estupidez e ambição desmedidas das suas elites e a violenta segregação encoberta pelo estigma de “terra da felicidade”. Assim é Salvador, uma cidade repleta de graves problemas sociais, econômicos e ambientais. Uma cidade que não sabe planejar seu futuro, pois vive se descuidando do seu presente. Uma cidade maltratada e maltrapilha que, de um lado nos aborrece e irrita, e, de outro, nos embala como uma mãe amantíssima, especialmente, quando o sol se põe e a brisa agita as águas frescas da baía querida. Parabéns Salvador, terra amada, terra à vista.

quinta-feira, 25 de março de 2010

TOME TEATRO! É HOJE!!!

A Casa dos Artistas de Ilhéus, com o apoio da Fundação Cultural, realiza nesta sexta-feira, 26, o TOME TEATRO! São 12 horas ininterruptas e gratuitas de arte, na Rua Jorge Amado, e dois palcos montados para dezenas de convidados, músicos, atores e atrizes, grupos e companhias num só objetivo: comemorar o Dia Internacional do Teatro e do Circo.
Participarei com uma breve mostra do Rock & Poesia, ao lado do meu amigo e poeta Heitor Brasileiro Filho e acompanhado da banda Dr. Imbira.
Apareçam! Divulguem!

quarta-feira, 24 de março de 2010

PIANO

Arrebata-me ao pôr-do-sol
o som de um piano distante;
sua canção, que desconheço,
trás magia por um instante;

entra pela porta e janela,
faz do aposento passarela

enquanto uma réstia de luz
cintila sobre o meu poema
que nesse momento transluz:

à folha toda iluminada
não cabe acrescentar mais nada.

segunda-feira, 22 de março de 2010

A voz dos botequins e outros poemas

A voz dos botequins e outros poemas reúne os poemas de Paul Verlaine que foram selecionados e traduzidos por Guilherme de Almeida para integrarem o volume “Paralelamente a Paul Verlaine”, lançado por ele em 1944. Apresentado também em edição bilíngue, este livro corresponde fielmente, quanto à seleção dos poemas e às recriações, à publicação original. Esta edição traz ainda em apêndice a entrevista concedida por Verlaine a Jules Huret em 1891, mais tarde reunida no volume “Enquête sur l'évolution littéraire”, e uma pequena iconografia.

O organizador da edição é o poeta e tradutor Marcelo Tápia.

Esse e outros bons lançamentos estão disponíveis no site da Editora Hedra, em: http://www.hedra.com.br

sábado, 20 de março de 2010

A AFRODESCENDÊNCIA - HISTÓRIA SÓCIO-ECONÔMICA DA BAHIA

Vale à pena conferir. O Museu Carlos Costa Pinto, localizado em Salvador, sob a coordenação da Profa. Ms. Selma Fraga Costa, apresenta em quatro módulos, um curso com abordagem da Afrodescendência na História da Bahia e aspectos sócio-econômicos e artísticos. Trata-se de uma atividade, sem dúvida, extremamente enriquecedora para quem puder participar.
Serão dois módulos no primeiro semestre e dois no segundo semestre.

PROGRAMAÇÃO

1º Módulo - ABRIL
Dias: 12, 13, 14, 15 e 16 de abril
A Bahia afrodescendente - Profa. Dra. Marli Geralda Teixeira

- Apresentação geral: presença africana na cultura baiana;
- Imagens da História da África;
- A Bahia no tráfico negreiro do Atlântico Sul;
- Marcas na construção econômica: trabalho rural e urbano;
- Etnia e mestiçagem na Bahia ontem e hoje.

2º Módulo - MAIO
Dias: 10, 11, 12, 13 e 14 de maio
Tópicos de História Socio-Econômica - Prof. Ms. Jailton Lima Brito

- A Bahia Colonial (XVI - XVIII);
- A Bahia na transição para o Estado Nacional (1789 - 1837);
- Resistência escrava, abolição e pós-abolição na Bahia (XIX);
- O "enigma baiano" (XIX - XX);
- Novos ventos sobre a Bahia: a industrialização e a reafricanização (XX).

Taxa única: R$ 60,00 por módulo

Auditório do Museu Carlos Costa Pinto
Av. Sete de Setembro, 2490 - Corredor da Vitória
Horário: 17 às 19 horas
Carga horária de cada módulo: 10 horas
Inscrição: Setor Educativo (de segunda a sexta, exceto terça-feira), das 14:30 às 19:00 horas.
Tel.: (71) 3336-6081

sexta-feira, 19 de março de 2010

A cultura tem problemas

Por Felipe Fortuna

A páginas tantas de O Pai de Família (1978), como se pretendesse pegar de surpresa o leitor, após análises sobre Franz Kafka, sobre o Cinema Novo e sobre cultura e política no Brasil da década de 60, Roberto Schwarz insere “19 Princípios para a Crítica Literária”. É um texto brincalhão, embora vazado como testemunho, experiência e sátira incisiva contra os hábitos e os modismos de um restrito grupo de acadêmicos – aqueles que escrevem sobre literatura. Elaborado em forma de tópicos, que mais parecem palavras de ordem, o texto também diverte quando se descobre que os 19 princípios são de fato 17, pois um deles se repete duas vezes à maneira de um mantra universitário. Cito-o: “Não esqueça: o marxismo é um reducionismo, e está superado pelo estruturalismo, pela fenomenologia, pela estilística, pela nova crítica americana, pelo formalismo russo, pela crítica estética, pela linguística e pela filosofia das formas simbólicas.” (...)

Mais em:
http://www.cronopios.com.br/site/critica.asp?id=4421

quarta-feira, 17 de março de 2010

A catástrofe dos Cursos de Letras

Artigo publicado originalmente na revista Caros Amigos, edição de novembro de 2008.
Por Marcos Bagno

A formação dos professores de português, hoje no Brasil, é uma catástrofe. Nós, responsáveis pelos cursos de Letras, não enxergamos a bomba-relógio que temos nas mãos. As estatísticas não mentem: a retumbante maioria dos estudantes de Letras vem de camadas sociais pobres ou mesmo miseráveis, filhos de pais analfabetos ou que têm escolarização inferior a quatro anos. Isso significa muita coisa. Significa que esses estudantes têm um histórico de letramento reduzido: no ambiente familiar, não convivem com a cultura letrada, não têm acesso a livros, revistas, enciclopédias. Não são falantes das normas urbanas de prestígio (as mesmas que supostamente terão de ensinar a seus futuros alunos) e têm domínio escasso da leitura e da escrita. Só na faculdade é que a maioria deles vai ler, pela primeira vez na vida, um romance inteiro ou um texto teórico.
Vêm, quase todos, do ensino público, essa tragédia ecológica brasileira pior que as queimadas na Amazônia. Nós, porém, fingimos que eles são ótimos leitores e redatores, e despejamos sobre eles, logo no primeiro semestre, teorias sofisticadas, que exigem alto poder de abstração e familiaridade com a reflexão filosófica, e textos de literatura clássica, escritos numa língua que para eles é quase estrangeira. E assim vamos nos iludindo e iludindo os estudantes.
O resultado é que os estudantes de Letras saem diplomados sem saber lingüística, sem saber teoria e crítica literária e sem saber escrever um texto acadêmico com pé e cabeça. Todos os dias, recebo mensagens de formandos que me pedem orientação para seus trabalhos finais. Alguns até me enviam seus projetos. São textos repletos de erros primários de ortografia, pontuação, sintaxe, vocabulário, com frases truncadas e sem sentido. Assim eles chegam ao final do curso, e suas monografias, mal escritas, sem nenhum rigor teórico ou metodológico, são aprovadas alegres e irresponsavelmente por seus supostos orientadores.
O problema, é claro, não está no fato (que merece comemoração) de acolhermos na universidade alunos vindos das camadas mais desfavorecidas da população. O problema é não oferecermos a eles condições de, primeiro, se familiarizar com o mundo acadêmico, que lhes é totalmente estranho, por meio de cursos intensivos (e exclusivos) de leitura e produção de textos, de muita leitura e muita produção de textos, para só depois desses (no mínimo) dois anos de preparação eles poderem começar a adentrar o terreno das teorias, das reflexões filosóficas, da alta literatura. Se não fizermos isso urgentemente (anteontem!), as salas de aula do ensino básico estarão ocupadas por professores que, mal sabendo ler e escrever adequadamente, não poderão desempenhar sua principal tarefa: ensinar a ler e a escrever adequadamente! Não sei, aliás, por que escrevi "estarão ocupadas": elas já estão ocupadas, neste momento, por essas pessoas, de quem se cobra tanto e a quem não se oferece uma formação docente que também seja, minimamente, decente.

Site do Bagno: http://www.marcosbagno.com.br/

domingo, 14 de março de 2010

Ao Poeta Castro Alves

neste dia nacional da poesia

I

Por que vieste assim, tão frágil,
sua vida beijando a morte,
se bebeu do leite da escrava
e se podia melhor sorte;

por que partiste muito jovem
se teus versos é que nos movem,

se teu canto é que nos conduz
sobre o éter dos novos dias,
caminho ao encontro da luz,

e por que não, sopro de vida
em meio à plêiade perdida?


II

Se nesta terra miserável,
irmã gêmea das asperezas,
floresce ainda a indiferença,
como cantar suas belezas

com ternura, feito um romântico,
se lá fora, de um modo drástico,

padece à luz do sol, à luz
da lua, o mesmo cativo,
o mesmo irmão de Jesus,

imagem e filho de um Deus
que insiste em faltar com os seus?


III

Se me disseres, nuvem negra,
que se amassa com os dois pés
o pão nosso de cada dia,
que na argamassa, a pontapés,

vai misturada toda angústia
para que seja a eucaristia

a comunhão dos desgraçados,
retrato fiel, sem retoque,
do firmamento desbotado;

devo crer, ainda, na fala
dessa voz grave que não cala?


IV

O que não muda com o tempo,
esperança estúpida e vã,
mudará mais o pensamento
na permanência do amanhã

ou será cera em nossas asas,
epitáfio em nossas covas rasas

porque jaz, muito a contragosto,
quem sobrevive nesta terra
e morre flébil, de desgosto,

por mentir com intensidade
antes de dizer a verdade?

sexta-feira, 12 de março de 2010

RUBEM BRAGA EM VERSOS

Faz poucos dias encontrei um livro que me deixou surpreso. Trata-se do “Livro de Versos”, de Rubem Braga, autor que entrou para a história da literatura brasileira através da crônica. Entre 1928 e 1990 foram mais de 15 mil. Menos de mil constam em livro.
Affonso Romano de Sant’Anna, no prefácio da obra, chama Rubem Braga de poeta. Antes, outros poetas já haviam falado da poesia do autor de Ai de ti, Copacabana: Bandeira e Drummond falaram de poesia ao falarem de Rubem Braga, o cronista. O mesmo fizeram Vinícius e Paulo Mendes Campos.
Se ele não é, feito estes, no dizer de Bandeira, “poeta de oficina montada” por que logo estes, em crônicas, falaram da poesia de Rubem Braga? Quem leu “A casa dos Braga” sabe o que estou dizendo. Provavelmente porque a poesia de Rubem Braga está, antes de tudo, em vívido lirismo existencial, no seu espírito, naquilo que diz, mesmo em prosa, nas crônicas – e nos raros versos, reunidos em livro. Vamos aos poemas!

SONETO

E quando nós saímos era a Lua,
Era o vento caído e o amor sereno
Azul e cinza-azul anoitecendo
A tarde ruiva das amendoeiras.

E respiramos, livres das ardências
Do sol, que nos levara à sombra cauta
Tangidos pelo canto das cigarras
Dentro e fora de nós exasperadas.

Andamos em silêncio pela praia.
Nos corpos leves e lavados ia
O sentimento do prazer cumprido.

Se mágoa me ficou na despedida
Não fez mal que ficasse, nem doesse –
Era bem doce, perto das antigas.
(1947)

AO ESPELHO

Tu, que não foste belo nem perfeito,
Ora te vejo (e tu me vês) com tédio
E vã melancolia, contrafeito,
Como a um condenado sem remédio.

Evitas meu olhar inquiridor
Fugindo, aos meus dois olhos vermelhos,
Porque já te falece algum valor
Para enfrentar o tédio dos espelhos.

Ontem bebeste em demasia, certo,
Mas não foi, convenhamos, a primeira
Nem a milésima vez que hás bebido.

Volta portanto a cara, vê de perto
A cara, tua cara verdadeira,
Oh Braga envelhecido, envilecido.
(1957)

quarta-feira, 10 de março de 2010

Senda, um poema que escrevi há três anos

breve comentário de Luis Dolhnikoff

Caro Gustavo, acabo de ler com calma a sua "Senda". Pois tomei um susto. Não sei o que esperava, mas sei agora que não esperava essa dicção e esse ritmo ominosos. Principalmente o ritmo. Não o identifiquei de imediato, o que é raro. Tive de contar para ver que se trata de octossílabos. O estranho é que esse metro, por incomum, costuma causar estranhamento, daí ter sido adotado por Cabral. Mas o efeito aqui não é de estranhamento. Esses versos têm uma "redondeza" quase decassilábica, mas como são mais curtos, me soaram como uma espécie de decassílabo adensado, condensado. Além disso, há esse decair de tom das rimas, que começam abertas na primeira estrofe e vão se agravando, se escurecendo. E os enjambements que talvez querem acelerar o ritmo, enquanto mais uma vez a redondeza de cada verso tende a autonomizá-los. E os ecos das rimas internas. O resultado, em suma, é redondamente tenso, ou de uma tensão arredondada, que resulta densamente no ominoso dito no início.

SENDA

Sou como o invisível céu
que não vos inspira cuidados,
pois retorno depois das névoas
sobre os campos abandonados;

sou finito e celebro o fogo
infindável do grande jogo

a nos enlaçar a garganta;
creio no vórtice da voz
sacrossanta que a tudo encanta:

trago os haveres desse mundo;
sou terra, sou campo fecundo.

OBS:
O termo “Ominoso”, neste texto possui o significado de “sombrio”. Diz o ensaísta: "há esse decair de tom das rimas, que começam abertas na primeira estrofe e vão se agravando, se escurecendo".

Ainda tem gente que acredita...

Recebi hoje, da amiga Silmara Oliveira, de Itajuípe, terra de Adonias Filho e Marcos Santarrita, um desses comunicados que raramente acontecem, mas que, quando chegam, nos deixam um pouco mais crentes no presente. Diz ela:

Querido Gustavo,
Estamos jubilosos em Itajuípe, pois nesta sexta-feira, estaremos inaugurando o nosso cinema.
A Associação de Filhos e Amigos de Itajuípe - AFAI, através de edital público do Minc/Cine Mais Cultura, foi contemplada com equipamento de cinema e, durante dois anos, estaremos exibindo filmes, especilamente, os nacionais, fazendo acontecer O Cineclube AFAI.

Há mais de 20 anos não temos cinema em Itajuípe, muitas crianças, adolescentes, jovens e adultos não têm o prazer de participar de uma sessão, numa sala apropriada.

Segue nosso cartaz para que você nos faça a gentileza de divulgar no seu blog e, aproveitamos para convidá-lo para a sexta-feira vir à nossa cidade reunir-se conosco nesse momento feliz e pleno.
Parabéns à Silmara, ao povo itajuipense e a todos da AFAI.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Monólogos…

Adoro monólogos. Cheguei até a escrever um, Monólogo de Don Juan, formado por 110 versos octossílabos, com o qual ganhei o Prêmio Bahia de Todas as Letras, edição 2009. Monólogos são fogo e água, dependem de dois fatores: a interpretação do ator e a qualidade do texto. Um precisa iluminar o outro, sempre.

No vídeo abaixo, o Monólogo das Mãos, texto brilhante de Giuseppe Ghiaroni, na interpretação não menos brilhante do grande Lúcio Mauro.

Aviso da Lua Que Menstrua

Elisa Lucinda

Moço, cuidado com ela!
Há que se ter cautela com esta gente que menstrua...
Imagine uma cachoeira às avessas:
cada ato que faz, o corpo confessa.
Cuidado, moço
às vezes parece erva, parece hera
cuidado com essa gente que gera
essa gente que se metamorfoseia
metade legível, metade sereia.
Barriga cresce, explode humanidades
e ainda volta pro lugar que é o mesmo lugar
mas é outro lugar, aí é que está:
cada palavra dita, antes de dizer, homem, reflita..
Sua boca maldita não sabe que cada palavra é ingrediente
que vai cair no mesmo planeta panela.
Cuidado com cada letra que manda pra ela!
Tá acostumada a viver por dentro,
transforma fato em elemento
a tudo refoga, ferve, frita
ainda sangra tudo no próximo mês.
Cuidado moço, quando cê pensa que escapou
é que chegou a sua vez!
Porque sou muito sua amiga
é que tô falando na "vera"
conheço cada uma, além de ser uma delas.
Você que saiu da fresta dela
delicada força quando voltar a ela.
Não vá sem ser convidado
ou sem os devidos cortejos..
Às vezes pela ponte de um beijo
já se alcança a "cidade secreta"
a Atlântida perdida.
Outras vezes várias metidas e mais se afasta dela.
Cuidado, moço, por você ter uma cobra entre as pernas
cai na condição de ser displicente
diante da própria serpente
Ela é uma cobra de avental
Não despreze a meditação doméstica
É da poeira do cotidiano
que a mulher extrai filosofando
cozinhando, costurando e você chega com a mão no bolso
julgando a arte do almoço: Eca!...
Você que não sabe onde está sua cueca?
Ah, meu cão desejado
tão preocupado em rosnar, ladrar e latir
então esquece de morder devagar
esquece de saber curtir, dividir.
E aí quando quer agredir
chama de vaca e galinha.
São duas dignas vizinhas do mundo daqui!
O que você tem pra falar de vaca?
O que você tem eu vou dizer e não se queixe:
VACA é sua mãe. De leite.
Vaca e galinha...
ora, não ofende. Enaltece, elogia:
comparando rainha com rainha
óvulo, ovo e leite
pensando que está agredindo
que tá falando palavrão imundo.
Tá, não, homem.
Tá citando o princípio do mundo!

Elisa Lucinda explica como fez esse poema e o declama:

sexta-feira, 5 de março de 2010

Letieres Leite e Orkestra Rumpilezz

Rumpilezz: Rum, Pi e Le (os três atabaques fundamentais do candomblé) mais o ‘zz’ de Jazz. E o som é esse: percussão de candomblé envolvida por arranjos jazzísticos. Arranjos do maestro Letieres Leite que conta com músicos formidáveis, como é o caso de Rowney Scott, André Becker, Joatan Nascimento e o tubista, Fernando Rocha. Na percussão o mestre Gabriel Guedes. O resultado é o frescor de uma música ardente e nova que nasce sob o signo da tradição.

Parece-nos que apenas aqui na Bahia um fenômeno assim pode acontecer com inteireza. Caso fosse em São Paulo, tal como foi com aquela baboseira chamada concretismo, primeiro escreveriam um manual de instruções dizendo como ouvir a Rumpilezz.
Perguntaram ao Ed Motta: O que você acha da música feita no Brasil hoje em dia, algo te emociona? Ele respondeu: Você conhece Letieres Leite e Orkestra Rumpilezz? É evidente que o cara não conhecia. Ele explicou: É a big band de um saxofonista baiano, que faz um som mesclando timbres de candomblé com sopros, dentro de uma abordagem totalmente jazz. Pra mim, o sujeito é o novo Moacir Santos. Música que me emociona mesmo. Além disso, nada.

É claro que a Bahia, como outros lugares, exporta muita merda para o país, mas se Letieres Leite e Orkestra Rumpilezz fossem de São Paulo ou do Rio, meu nego, já tinha virado fenômeno.

No vídeo abaixo a orquestra se apresenta com outro gênio imortal da música baiana, brasileira, o mestre Cacau do Pandeiro, integrante do grupo de chorinho Os ingênuos.
Confira a página no Myspace:

quinta-feira, 4 de março de 2010

Ao Martin Luther King

Se neste tempo te encontrasses
um vôo apenas bastaria
para veres tanto infortúnio,
tanto abutre na ramaria,

o tempo tredo, a vida lerda,
a treva e toda essa merda,

favelas iguais a mocambos
e os miseráveis pelos cantos,
os mais humildes já sem ombros,

sem brisa, abraço ou a alegria
de quem vive alguma fantasia.

terça-feira, 2 de março de 2010

Filosofia (Ascenso Ferreira)

A José Pereira de Araújo -
"Doutorzinho de Escada"

Hora de comer — comer!
Hora de dormir — dormir!
Hora de vadiar — vadiar!
Hora de trabalhar?
— Pernas pro ar que ninguém é de ferro!

Poema publicado em "Catimbó e Outros Poemas", Editora José Olympio - Rio de Janeiro, 1963. Inserido em "Os Cem Melhores Poemas Brasileiros do Século", Editora Objetiva - Rio de Janeiro, organizada por Ítalo Moriconi.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Revista Celuzlose - 4ª Edição

Pessoal, a quarta edição da revista Celuzlose acabou de ficar pronta e já está disponível na internet. Meus destaques vão para a entrevista com Carlos Felipe Moisés, os poemas de Eunice Arruda e Rodrigo Garcia Lopens, bem como a seção O que é poesia, baseada no livro organizado pelo poeta Edson Cruz.

Para acessá-la, basta clicar no link abaixo:
http://issuu.com/celuzlose/docs/celuzlose_04