sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Dois anos sem Bruno Tolentino, dois poemas inspirados na obra do mestre

Sempre que volto à obra de Bruno Tolentino (1940 – 2007), surge em mim uma questão relacionada ao que mais se pode dizer sobre ela. É evidente que, pela sua universalidade, pode ser vista sob diversos ângulos, uns mais originais, outros nem tanto. Entretanto, sem dúvida alguma, quando penso nesta questão, um exemplo muito claro me assalta: seu legado para as novas gerações, sua consciência literária, seu esmero e integridade intelectual, sem necessitar recorrer, como ele mesmo diz “ao balcão das conveniências e cambalachos”. Nesse sentido, Antônio Houaiss, escrevendo sobre OS DEUSES DE HOJE, refere-se a Bruno Tolentino como "o intérprete destes tempos que não busca o compadrio dos expertos e artimanhosos..."
É mesmo de se admirar que um poeta maldito, com a “língua entortada pelo vício da ironia, quando não do sarcasmo”, segundo ele mesmo, cuja obra dificilmente será devidamente lida e digerida nos próximos dez anos, tenha vencido, entre outros, três vezes o maior prêmio literário brasileiro, o Jabuti, prova inconteste do poder da obra de um autor que sempre condenou os bairrismos, as corriolas, legando-nos tanto uma obra grandiosa quanto seu exemplo maior: a honestidade intelectual. Talvez seja por isso mesmo que tantos ótimos jovens poetas, atentos ao valor das coisas, estejam “pagando” seus tributos à obra e ao pensamento de Bruno Tolentino.

Bruno Tolentino no caminho de Beatriz
Astier Basílio (PB)

Aos teus pés se apresenta o último círculo.
A capela em que entram é uma neblina.
Há rumores com túnicas, onde os livros
são escritos à mão. O chão que pisas
não permite sandálias, nem recibos.
Nenhuma réplica, ali não há galeria
as imagens são seu espelho e mito,
são vivos os vitrais nesta Sistina
onde a idéia se faz em pedra e signo.
Entre incensos os pés de Deus caminham
como um vento a chamar cada escolhido.
Uma porta se sabe, outra adivinha-se.
Cumprimentas os anjos em sua língua.
O teu nome é chamado. E o resto é abismo.


A BALADA DA MEDUSA
Silvério Duque (BA)

de um Trompe L’œil à Tolentino
sob a forma de um possível soneto inglês


ao Jessé de Almeida Primo

Nosso amor, como tudo neste mundo,
é um risco, um faz-de-conta... uma impressão
sem sentido, uma tola profusão
do imperfeito e do imprevisto, do fundo
escuro e sem sentido do desejo.
Nossa dor como tudo nesta vida
é um desespero – pedra confundida
com a ânsia alucinada do teu beijo – ,
uma alucinação – olhar desfeito
ante à sombra, à luz, à escuridão –
e tantos mais contrários desta união
do feito, do perfeito e do refeito:
e, assim, se somam tudo quanto é triste
sem saber qual de nós menos existe.

Sugestão de leitura externa:
“Bruno Tolentino e a literatura ocidental”, de Pedro Sette Câmara: http://oindividuo.com/2008/06/30/bruno-tolentino-e-a-literatura-ocidental/

Um comentário:

Paula: pesponteando disse...

Não conhecia esse autor, obrigada por contribuir p meu crescimento...

Abraços